quarta-feira, novembro 29, 2006

David Mourão-Ferreira


















Teoria das marés

Calidamente nua,
sob o vestido leve,
tua carne flutua
no desejo que teve.

Timidamente nua,
revelas, num olhar,
em minhas mãos, a lua
que te fez oscilar.

Encontro

O teu mistério decifrei-o
numa pupila cega:
fechado e aberto como um seio
que pela noite se me entrega.

A luz, se vinha, não descia
do coração nem dos sentidos:
mas concentrava a extática alegria
de nos sentirmos confundidos.










Soneto do cativo

Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias,
tão longe da verdade e da invenção;

o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que os outros dirão ou não dirão;

se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;

não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso.

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domingo, novembro 26, 2006

Crank


Crank - Veneno no Sangue

Realização:
Mark Neveldine/Brian Taylor

Elenco:
Jason Statham
Amy Smart
Efren Ramirez













Sinopse:
Um assassino (Statham) fica a saber que um veneno injectado no seu corpo o irá matar se o seu ritmo cardíaco baixar demasiado. Agora, terá que procurar vingar-se das pessoas responsáveis antes que dê o seu último sopro de vida...












Comentário:
Crank passa depressa, porque tem apenas 87 minutos e porque todo o filme é uma corrida contra o tempo, neste caso uma corrida tão veloz que parece que corremos também com o protagonista. E por falar em protagonista, este é mais um daqueles papéis típicos atribuídos a Jason Statham, de mafioso, ladrão, assassino, num filme de acção, que parece ser o eterno karma de Statham. No entanto devo afirmar que até me agrada o estilo do mesmo, apesar da expressão facial ser muito constante, sem alterações.
Crank não é um grande filme, com uma grande história, mas tem os seus momentos, algum humor (por vezes previsível) uma acção rápida, uns planos curiosos, e a capacidade de não cansar, mas distrair durante esses minutos.

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sábado, novembro 25, 2006

Devil wears Prada


The Devil Wears Prada
O Diabo Veste Prada

Realização:
David Frankel

Elenco:
Meryl Streep
Anne Hathaway
Emily Blunt
Stanley Tucci





Sinopse:
Andrea Sachs (Hathaway) é uma jovem recém-licenciada que consegue um trabalho de sonho - ser assistente da Miranda Priestly (Streep), a reputada editora de moda da revista Runway e a mais poderosa mulher do mundo da moda. Mas a implacável editora faz-lhe a vida negra, atribuindo-lhe tarefas que pouco têm a ver com a revista. Valerá a pena trabalhar para um diabo que veste Prada?


















Comentário:
Atrasada, mas de volta às lides cinematográficas...hoje à tarde (o que me parece ser um horário próprio para ver este filme) resolvi ver "Devil wears Prada".
A premissa do filme não é original, e Anne Hathaway volta a ter de novo o papel da desajeitada rapariga (the Princess Diaries)que vinga e prova ser capaz de muito mais. Apesar disso, devo afirmar que, neste filme, Hathaway se superou, em comparação com "diário da princesa". No entanto podemos ainda tirar do filme uma crítica curiosa ao mundo da moda e, principalmente, rever Meryl Streep, a imbatível, a inesquecível, a grande.
Como disse... um bom filme para rir um pouco e passar uma tarde de sábado.

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quinta-feira, novembro 23, 2006

Concerto de Pato Fu














Concerto de Pato Fu na Aula Magna, com a inconfundível presença de Manuela Azevedo... Palavras para quê? Ficam as memórias do momento...














Agridoce
Pato Fu
Composição: John

Por que você às vezes
Se faz de ruim?
Tenta me convencer
Que não mereço viver
Que não presto, enfim

Saio em segredo
Você nem vai notar
E assim sem despedida
Saio de sua vida
Tão espetacular

E ao chegar lá fora
Direi que fui embora
E que o mundo já pode se acabar
Pois tudo mais que existe
Só faz lembrar que o triste
Está em todo lugar

E quando acordo cedo
De uma noite sem sal
Sinto o gosto azedo
De uma vida doce
E amarga no final

Saio sem alarde
Sei que já vou tarde
Não tenho pressa
Nada a me esperar
Nenhuma novidade
As ruas da cidade
O mesmo velho mar














Problema de Expressão
Clã
(CarlosTê / Hélder Gonçalves)

Só p´ra dizer que te amo
nem sempre encontro o melhor termo
nem sempre escolho o melhor modo
devia ser como no cinema
a língua inglesa fica sempre bem
e nunca atraiçoa ninguém
o teu mundo está tão perto do meu
e o que digo está tão longe
como o mar está do céu
só p´ra dizer que te amo
não sei porquê este embaraço
que mais parece que só te estimo
e há até um momento
em que digo o que não quero
e o que sinto por ti
são coisas confusas
e até parece que estou a mentir
as palavras custam a sair
não digo o que estou a sentir
digo o contrário do que estou a sentir
o teu mundo está tão perto do meu
e o que digo está tão longe
como o mar está do céu
e é tão difícil dizer amor
é bem melhor
dizê-lo a cantar
por isso esta noite
fiz esta canção
para resolver
o meu problema de expressão
p´ra ficar mais perto
bem mais perto
ficar mais perto
bem mais de perto














Carrossel Dos Esquisitos
Clã
John Ulhoa \ Hélder Gonçalves

sou mais um no carrossel
dos esquisitos
gente feia a girar
não é bonito?
juntos vamos celebrar
esta nossa palidez
que não dá p’ra disfarçar

como abutres no céu
são quase lindos
dois feiosos a rodar
gritando e rindo
são aberrações no ar
oh meu querido
fecha os olhos p’ra me beijar
que o mundo vai-se acabar

menos p’ra ti e p’ra mim
enquanto eu não te olhar
de tão perto assim
p’ra não me assustar

se uma bomba nuclear
tem a sua beleza
gente feia tem também
nem mesmo mata ninguém
que não mereça sim
morrer por ser ruim
por fazer sofrer
quem me quer assim

sobramos só nós dois
ninguém p’ra comparar
o nosso bolo de arroz
com champanhe e caviar

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segunda-feira, novembro 20, 2006

A ilha desconhecida



O Conto da Ilha Desconhecida
Autor: José Saramago






Leve, suave e agradável...

"Se não sais de ti, não chegas a saber quem és."

"As pessoas enganam-se nos sentidos do olhar, sobretudo ao princípio."

"Pela hora do meio-dia, com a maré, a Ilha Desconhecida fez-se enfim ao mar, à procura de si mesma."

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domingo, novembro 19, 2006

Beethoven, Cecilia Bartoli, Händel e Bethânia...














Tudo começa com um copo de vinho e um travo musical a propósito de Beethoven e da 9ª sinfonia:
Diz uma amiga apaixonada pelo mestre, explicando onde nasceu essa paixão:
"Começou num concerto. No final senti-o como se ele estivesse lá para me aproximar da sua música, para que eu compreendesse a sua música.
Depois disso todas as vezes que ouvia Beethoven sentia a presença dele. É uma música tão humana e tão emocional..."

De seguida ouvia-se já a voz inebriante de Cecilia Bartoli, ao som de Händel:

Händel
Lascia la spina, cogli la rosa
Aria del piacere

Lascia la spina,
cogli la rosa;
tu vai cercando
il tuo dolor.
Canuta brina,
per mano ascosa,
giungerà quando
nol crede il cor.

Händel
Un pensiero nemico di pace
Aria della bellezza

Un pensiero nemico di pace,
fece il Tempo volubile edace,
E con l'ali la falce gli diè.
Nacque un altro leggiadro pensiero,
per negar sì rigido impero,
ond'il Tempo più Tempo non è.














A seguir o registo era outro, Maria Cristina Kiehr cantando Benedetto Ferrari:

Cantata spirituale (Seconda parte)

Ahi, miserella ascolta
i tuoi vani diletti
i piaceri, i contenti
inducono, conducono
o pene, o stenti,
tè stessa al cieco inferno.
Deh, si, deh mira una volta
del tuo celeste amante
le ferite e i tormenti
che chiamano, richiamano
o, dolci accenti,
tè stessa el cielo eterno.
E pure, anima mia
non sai che sia dolore,
ancor non senti amore?














E porque a música é de embriaguez constante, e povoa todo o nosso universo, continua-se no vinho, não se abandona a música, vai-se até aos caminhos da Bethânia:

Cantada (depois de ter você)

Depois de ter você
Pra que querer saber
Que horas são?

Se é noite ou faz calor
Se estamos no verão
Se o sol virá ou não
Ou pra que é que serve
Uma canção como esta?

Depois de ter você
Poetas para quê?
Os deuses, as dúvidas
Pra que amendoeiras pelas ruas?
Pra que servem as ruas?
Depois de ter você...

Pra rua me levar

Não vou viver
Como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho onde eu vou
Às vezes ando só trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão

Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora

Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você

É, mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas talvez você nem queira ouvir

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terça-feira, novembro 14, 2006

As frases do júbilo












Muitas vezes pensei e falei nas dificuldades da profissão de professor. Mas, por detrás dessas dificuldades, há os momentos de brilho e de realização, que são muitos, sem sombra de dúvidas.
Hoje apenas refiro duas frases que me ficarão sempre na memória, junto a outras que vamos ouvindo ao longo da nossa carreira, e me encheram de júbilo.

1ª- "Quando sair desta escola a única pessoa de quem vou sentir falta é de si."

2ª- "Quando entrei naquela sala para ser avaliada, sentia-me nervosa, ao olhar as pessoas do júri encontrei-a a si e senti que era o meu sol, o nervosismo desapareceu."

Acho que sempre sonhei ser um Keating na vida de alguém, porque eu tive a sorte de ter esse Keating (há 15 anos atrás), que no meu caso se chamava São e existe agora, já não como professora, mas como uma grande e eterna amiga, que amo de coração.
Por isso, este post é dedicado a muitos professores, mas em especial à minha grande e sublime São!!!

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E como os dias são cansativos, o trabalho é muito e a estupidez é tanta, vou ali à Lua de Ipanema beber um Bacardi. Até já...

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Amx- "Cumprir um passo de capoeira, pé atrás, pé à frente!"
Rt5 - "Despida de tudo o que possa existir, escolho o melhor rumo!"
Cat. - "A água representa as emoções".
Jb- "Como um bom livro que acabaste de ler."
Rd- "Todo o homem morre, mas nem todo o homem vive."
Mp - "Falei com o sol que falou com a lua, liguei às estrelas que falaram com a noite, pedi ao mar e às marés, ao vento que parasse, à chuva que abrandasse."
Fra - Vinicius, Galliano, Stan Getz, Perfume, Chico Buarque, Ava Gardner, música, cinema, livros e cor…há melhor?!
Silc - "Tiveste tudo o que querias até à exaustão, agora tens um "tudo" mais tranquilo, mais verdadeiro, menos ilusório. Se calhar este é o caminho que te faltava!"

Operário em construção

Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as asas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De facto como podia
Um operário em construção
Compreender porque um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento

Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse eventualmente
Um operário em construção.
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garrafa, prato, facão
Era ele quem fazia
Ele, um humilde operário
Um operário em construção.
Olhou em torno: a gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro dessa compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
- Exercer a profissão -
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia "sim"
Começou a dizer "não"
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução

Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação.
- "Convençam-no" do contrário
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isto sorria.

Dia seguinte o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu por destinado
Sua primeira agressão
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!

Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras seguiram
Muitas outras seguirão
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.

Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo contrário
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
- Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher
Portanto, tudo o que ver
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.

Disse e fitou o operário
Que olhava e reflectia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria
O operário via casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objectos
Produtos, manufacturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!

- Loucura! - gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
- Mentira! - disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.

E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fracturas
A se arrastarem no chão
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção

Vinicius de Moraes

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sábado, novembro 11, 2006

Cidade












Estou sentada do lado de cá, para trás das minhas costas ficou uma noite de S. João, lá ao longe ficou um passeio pelo rio. Hoje, fica este momento, este anoitecer com um sabor diferente, com uma luz diferente, fica este caminho que se abre e deixa ver uma perspectiva diferente de ti, Cidade Surpresa, Cidade Mistério, Cidade em tempos Mulher.
Revejo-te agora, relembro-te agora, para que possa renovar-te neste instante e dar-te outro nome.
Levanto-me e deixo-te com a luz da noite, vou com a certeza de que foste transfigurada, de que és Cidade nova, Cidade vida. Até breve...
Gostei de te reencontrar no passado, desconstruir-te no presente e renovar-te no futuro...

"O teu romantismo é a tua tuberculose."
Cat.

"O mês em que sonhei e confirmei a minha recusa no acordar..."
Lua

"Os mistérios da vida desvendam-se de olhos fechados..."
Cat.

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Bacardi influence

quarta-feira, novembro 08, 2006

Évora










"Sobre o casario branco vou descobrindo aqui e além manchas negras de velhos templos, e ao alto, disparadas ao céu, as torres da Sé."
"A cidade resplandecia a um sol familiar, branca, enredada de ruas como de velhas ciladas, semeada de ruínas, de arcos partidos, nichos de santos das orações de outras eras, janelas góticas, como olhares embiocados. Évora mortuária, encruzilhada de raças, ossuário dos séculos e dos sonhos dos homens, como te lembro, como me dóis!"









"O Liceu estava deserto, as aulas começariam daí a dias, agora haveria apenas os exames da segunda época. E jamais eu esqueceria essa aparição do Liceu, como a de toda a cidade, tão estranha. Templo de Diana. Só nessa noite o vi bem, nessa noite de Setembro, lavado de uma grande lua - raios imóveis de uma oração mutilada, silenciosa imagem do arrepio dos séculos..."

Vergílio Ferreira, Aparição

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segunda-feira, novembro 06, 2006

Asfixia


Asfixia - Pedro Paixão
Editora: Quetzal Editores






Sinopse:
Pequenas ficções a partir de "histórias reais", em que universos distintos (que no entanto se podem ver como um todo) são explorados numa prosa clara, sintética, irónica e poética. Uma escrita sensível e contemporânea sobre o amor, o desejo, o desespero, a procura, o encontro e o desencontro, a solidão, a morte, e também a esperança.

"Sonhei que te beijava muito, longamente. Sobre uma duna, branco o mar distante. Porque estva calor, de quando em quando, servíamo-nos do vento que fazíamos com leques. Depois voltávamos a beijar-nos durante muito tempo. Também mordia os teus cabelos que me lembravam de ti, do teu nome. Os teus olhos reflectiam o sol, cintilavam intensamente."

"Logo na noite em que te vi fiquei doido por não poder dormir contigo. Não conseguia adormecer. Uma tremenda cobiça dava-me cabo do desejo. Eras uma musa encantada, talvez fosse isso, ou um corpo que eu queria desfazer num aperto, ou mesmo as duas coisas misturadas. Tinhas o fascínio, a magia, a sedução perigosa que pode conduzir ao delírio e à morte. Tive de tomar comprimidos. Estavas de passagem e pelas ruas por onde seguias deixavas um rasto de desejo. Os homens olhavam-te com respeito, ficavam calados, baixavam os olhos. Não podia deixar de te perseguir. Era um golpe, uma dor de alma ver-te e não tocar-te. Logo que pude meti-me num avião que me levasse à tua cidade."




Citação:
Escrever pode ser uma óptima desculpa para quem na vida não tem qualquer esperança. É uma maneira de preencher uma sombra e há momentos em que um beijo escrito vale por muitos. (Nos teus braços morreríamos)

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sábado, novembro 04, 2006

A lula e a baleia


The Squid and the Whale (A Lula e a Baleia)
Realização:
Noah Baumbach

Elenco:
Jeff Daniels
Laura Linney
Jesse Eisenberg
William Baldwin
Anna Paquin





Sinopse:
Bernard (Jeff Daniels), um académico e autor, e a sua agitada mulher Joan (Laura Linney) e escritora, desistiram do seu casamento. Os seus dois filhos Walt (Jesse Eisenberg), 16, e Frank (Owen Kline), 12, são deixados a lutar com os seus sentimentos confusos e conflituosos.


"Sem as lágrimas habituais mas com um charme bem ácido, o filme extremamente humano de Baumbach toca bem fundo."
Peter Travers, Rolling Stone

Comentário:
Entre o drama e a comédia, "A Lula e a Baleia" retrata o ruir de um casamento e as marcas que este acontecimento deixa em todos, em particular nos filhos do casal. As interpretações são todas de mestre. Jeff Daniels, meio desaparecido e em papéis menos relevantes, surge aqui numa boa interpretação,num contexto que lhe é pouco frequente, no cinema Independente. Jesse Eisenberg e Owen Kline, como filhos do casal, representam de uma forma bastante coerente e madura, apesar de serem muito jovens, os seus gestos, as suas falas e as suas expressões que condesam toda a dor e a dificuldade pela situação em que se vêm envolvidos de surpresa. Laura Linney mantém a sua subtileza e discrição, num papel forte, encarnando a matriarca distanciada do marido, em ascensão profissional, envolvida em constantes casos amorosos.
Um filme de qualidade que retrata um pouco da experiência do realizador, filmado em 23 dias, com a duração de 81 minutos, mas suficiente para mostrar o lado confuso do desamor e da separação, e para provar como se fazem bons filmes, longe das grandes produções.

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De novo em Novembro











Sexta-feira, dia 3 de Novembro, dia de chuva, dia de reflexão, regresso a coisas perdidas como concertos na Gulbenkian na companhia de bons amigos. Curiosamente o último concerto que vi na Gulbenkian foi em Novembro de 2005...

O concerto de hoje:

Orquestra Gulbenkian
(Maestro) Lawrence Foster
(Barítono) Matthias Goerne

Música:
Josef Strauss - Música das esferas - Valsa, op.235
Kurt Weill - Sinfonia nº 2
Gustav Mahler - Kindertotenlieder
Franz Schubert - Sinfonia nº 8, em Si menor, D.759, Incompleta


Da singeleza de Strauss à profunda tristeza de Mahler, um universo musical para descontrair, reflectir, fruir e navegar...

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quinta-feira, novembro 02, 2006

Recordações musicais




Recordações musicais de há um ano atrás. Frio, chuva, Novembro, cansaço, medo. A lei do eterno retorno. Caminho percorrido, caminho traçado, caminho encontrado.








Behind These Hazel Eyes -Kelly Clarkson

Seems like just yesterday, you were a part of me
I used to stand so tall, I used to be so strong
Your arms around me tight, everything it felt so right
Unbreakable, like nothing could go wrong

Now I can´t breathe, no I can´t sleep
I’m barely hanging on

Here I am, once again
I’m torn into pieces, can´t deny it, can´t pretend
Just thought you were the one
Broken up, deep inside
But you won´t get to see the tears I cry
Behind these hazel eyes

I told you everything, opened up and let you in
You made me feel alright, for once in my life
Now all that’s left of me, is what I pretend to be
So together, but so broken up inside

Cause I can’t breathe, no I can’t sleep
I’m barely hanging on

Here I am, once again
I’m torn into pieces, can´t deny it, can´t pretend
Just thought you were the one
Broken up, deep inside
But you wont get to see the tears I’ve cried
Behind these hazel eyes

Swallow me, then spit me out
For hating you, I blame myself
Seeing you, it kills me now
No, I don’t cry on the outside anymore
Anymore

Here I am, once again
I’m torn into pieces, can´t deny it, can´t pretend
Just thought you were the one
Broken up, deep inside
But you wont get to see the tears I cry
Behind these hazel eyes

Here I am, once again
I’m torn into pieces, can´t deny it, can´t pretend
Just thought you were the one
Broken up, deep inside
But you wont get to see the tears I cry
Behind these hazel eyes


















Other Side Of The World - KT Tunstall

Over the sea and far away
She's waiting like an iceberg
Waiting to change
But she's cold inside
She wants to be like the water

All the muscles tighten in her face
Buries her soul in one embrace
They're one and the same
Just like water

The fire fades away
Most of everyday
Is full of tired excuses
But it's too hard to say
I wish it were simple
But we give up easily
You're close enough to see that
You're the other side of the world to me

On comes the panic light
Holding on with fingers and feelings alike
But the time has come
To move along

The fire fades away
Most of everyday
Is full of tired excuses
But it's too hard to say
I wish it were simple
But we give up easily
You're close enough to see that
You're the other side of the world

Can you help me
Can you let me go
And can you still love me
When you can't see me anymore

And the fire fades away
Most of everyday
Is full of tired excuses
But it's too hard to say
I wish it were simple
But we give up easily
You're close enough to see that
You're the other side of the world

Oh, the other side of the world
You're the other side of the world to me

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quarta-feira, novembro 01, 2006

Salazar - Agora, na hora da sua morte



Salazar: Agora, na Hora da Sua Morte
Cotrim, Joao Paulo/ Rocha, Miguel
Editor: Parceria a. m. Pereira
Ano de edição: 2006
Local de edição: Lisboa
















Salazar como nunca o vimos
F. Cleto e Pina



Tem por título "Salazar - Agora, na hora da sua morte" e é um dos lançamentos mais surpreendentes da BD portuguesa contemporânea, que raras vezes tem sabido ser polémica ou provocadora, mostrando que vive uma fase de maturidade e pode seduzir fora do seu círculo de leitores habituais.

Na sua origem, explica João Paulo Cotrim, o argumentista, "esteve um curioso convite da Parceria A. M. Pereira", chancela original das entrevistas de António Ferro ou das "Férias com Salazar", de Christine Garnier.

Mas faz sentido uma biografia de Salazar em BD? "Porque não? É uma figura tão produtiva, de soturna complexidade, que se estranha não ter sido abordada mais vezes por outros objectos artísticos. A BD possui ferramentas que permitem uma variedade extraordinária. Há coisas que só podem ser ditas com um romance desenhado".

Esta é uma obra madura, distinguida pelo Festival de BD da Amadora como Melhor Álbum, Desenho e Argumento e "o muito saboroso prémio das escolas". Um ano e meio - ao longo do qual decorreram "conversas com investigadores, reportagem jornalística e consulta a livros de época e fotobiografias" - foi quanto demorou o trabalho .

in "Jornal de Notícias"

Curiosa abordagem da vida de Salazar, sem dúvida visto noutra perspectiva!

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Cântico negro

José Régio

Nascimento: 1901 Vila do Conde
Morte: 1969
País: Portugal


Cântico Negro

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

Comentários para quê?! Com a força destas palavras!!!

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